Bilbau, antigo bastião de armazéns, docas e indústria, apresenta-se como uma cidade moderna, cosmopolita e a fervilhar em arte contemporânea.
Um evento por trabalho tornou-se a desculpa perfeita para conhecer a capital do País Basco durante uns dias. Tinha motivos de sobra para estar entusiasmada com a visita.
Desde que vivo em Espanha que tinha uma curiosidade especial sobre este território protegido por montanhas impenetráveis, de clima agreste, rodeado por uma aura mística de um povo que soube manter a sua cultura e preservar a sua língua desde os primórdios da formação da Europa.
"Te respiré, Bilbao, y nos sentimos yo y tu hijo hermanos en bilbainía. Tuve un rato en mis manos su mano abandonada, y al despedirnos, para mí, me dije: hermanos somos todos los humanos, el mundo entero es un Bilbao más grande."
Rimas de dentro, Miguel de Unamuno em 1908, publicado em 1923
A cidade recebeu-nos com uma chuva miudinha que não atrapalhou em nada o propósito desse final de tarde: encontrar um restaurante acolhedor para jantar. La Viña del Ensanche foi acerto à primeira e a confirmação de que a gastronomia se iria intrometer indubitavelmente nos nossos planos.
Museu Guggenheim.
No primeiro dia, reservámos a tarde para visitar a principal atração da cidade.
Há duas décadas, Bilbau recebeu o Museu Guggenheim, que alterou o panorama paisagístico, cultural e social da cidade.
A visita ao museu começa logo no seu exterior. Somos imediatamente atraídos pela sua enorme forma disforme, um barco com escamas de titânio, obra do arquiteto Frank Gehry que se inspirou nos peixes barbos que a sua avó mantinha vivos na banheira dentro de casa no Canadá.
Várias esculturas de artistas de renome complementam esta exposição de arte na rua.
O Puppy de Jeff Koons representa um jardim europeu do século XVIII em forma de um cachorro West Highland Terrier gigante que floresce ao compasso das estações do ano. A aranha raquítica de 9 metros de altura, a quem o escultor Louise Bourgeois chamou de Mamã, é uma homenagem à sua mãe, que era tecelã, e uma alegoria à fortaleza e fragilidade da maternidade.
Entrada do Guggenheim; Louise Bourgeois, Maman, 1999; Jeff Koons, Puppy, 1992; Andy Warhol, One Hundred and Fifty Multicolored Marilyns, 1979.
Entrando no museu, fomos absorvidos pela dimensão esmagadora das 19 galerias. A grande maioria das obras pertencem à corrente do expressionismo abstrato, o movimento pós Segunda Guerra Mundial.
Passeámos entre as características Marilyn Monroe de Andy Warhol, as obras polémicas de Jean-Michel Basquiat, o azul profundo de Yves Klien ou os absorventes retângulos de cor de Mark Rothko.
Demorei-me na instalação de Richard Serra, a Matéria do Tempo. As oito esculturas em aço de diferentes formas, alturas e curvaturas levaram-nos a perder a noção do tempo e a experienciar a instalação a ritmos diferentes.
Yves Klein, La grande Anthropométrie bleue (ANT 105), ca. 1960; Anselm Kiefer, Die berühmten Orden der Nacht, 1997; Richard Serra, The Matter of Time, 1994–2005; Dora Salazar, Las Sirgueras, 2021.
No dia seguinte, passeámos junto à ria acompanhados pelo cônsul honorário de Bilbau, um basco de gema, mas com Portugal no coração.
Debaixo de aguaceiros intensos e rajadas de vento que não o afetavam, guiou-nos pelo perfil arquitetónico da cidade contanto as curiosidades da cidade e tratando os edifícios por nome próprio e apelido.
O "nosso" Siza Vieira projetou um dos pavilhões da Universidade do País Basco, um edifício que entra em diálogo com a Biblioteca da Universidade de Deusto do também prémio Pritzer, o espanhol Rafael Moneo.
O japonês Arata Isozaki que criou dois edifícios que desafiam o estilo clássico das antigas casas e simulam a nova porta da cidade do século XIX e para finalizar a ponte retorcida e polémica Zubizuri de Calatrava, o mesmo arquiteto que desenhou a estação Gare do Oriente em Lisboa. O cristal que cobria o chão da ponte pedonal, altamente escorregadio dado o clima húmido da cidade, foi substituto por um material mais aderente para enorme desagrado do arquiteto.
De todas as sucessões de obras de arte que encontramos pelo Paseo de Uribitarte a que mais me impressionou foi a Las Sirgueras, da artista navarra Dora Salazar. Um grupo escultórico representa as mulheres que, em troca de quase nada, rebocavam as barcas encalhadas na areia da ria de Bilbau puxando por uma corda (sirga) no final do século XIX.
Para ter uma vista panorâmica, subimos pelo pitoresco funicular até ao miradouro de Artxanda, uma das zonas de ócio mais concorridas e um local emblemático da cidade. As palavras Bilbao e Bilbo alternam-se para dar um toque colorido e divertido à paisagem.
O acolhedor restaurante Zapirain; O vinho que acompanhou o jantar; Ameijoas com molho verde e alcachofras grelhadas; A mesa das sobremesas.
Esperava que se comesse bem em Bilbau, a fama precede a região e a proximidade ao mar garantiam a frescura do peixe e marisco. Mas a gastronomia bilbaína superou em larga escala.
É conhecida pelos pintxos: pequenas iguarias, geralmente servidas em cima de uma fatia de pão, em que a criatividade não impõe limites. Emolduram os balcões de qualquer pequeno bar ou restaurante, acompanham qualquer momento do dia e nunca se prova apenas um.
Num registo totalmente diferente, o restaurante Zapirain proporcionou-nos uma experiência gastronómica inolvidable. O restaurante familiar, calmo e elegante transmite-nos a sensação de comida caseira preparada com o cuidado e atenção. Os diferentes pratos, quase todos à base de peixe, sucediam-se, acompanhados por um vinho da região.
Fachadas coloridas a refletir a luz do sol; O bairro histórico de Zazpikaleak; A Alhóndiga, o antigo armazém de vinho e azeite; Uma das 43 colunas que sustentam o edifício.
Uns raios de sol deram-nos descanso e permitiram-me explorar o bairro Zazpikaleak sem ficar com as botas enlameadas.
O centro histórico foi fundado em 1300 como porto estrategicmente longe do mar, protegido de ataques e tempestades. Pouco resta das casas de madeira medievais, rapidamente as Siete Calles iniciais, estreitas e labirínticas, tornaram-se insuficientes e Bilbau cresceu. Os solares de fachadas ornamentadas e coloridas são dos séculos XVI e XVII.
Cruzando a ria e caminhando um pouco, cheguei à Alhóndiga, um espaço de intercâmbio cultural aberto a todos os curiosos. O interior do edifício está suspenso por 43 colunas que o arquiteto francês Philippe Starck converteu em protagonistas ao permitir que 120 artesãos as decorassem com as mais diversas técnicas, cores, materiais, formas e texturas.
Uns cubos de luz espalhados pela superfície e a única fonte de iluminação serviam de banco a jovens que trabalhavam no computador, pais que descansavam enquanto os filhos corriam entre as colunas e a velhotes que se protegiam da chuva miudinha que entretanto regressou.
Em Bilbau, o visível contraste entre o passado da cidade portuária e a arquitetura moderna, marcada por obras de artistas contemporâneos, criam uma harmonia única que reflete a rica evolução cultural e urbana da cidade.
Vista da cidade de Bilbau desde o miradouro de Artxanda.
Choveu todos os dias, várias vezes ao dia, e nuvens rasantes cobriram o céu, impenetráveis a qualquer raio de sol.
Prometi regressar nos meses quentes de verão! No entanto, também não há garantia de que faça bom tempo nessa altura… Paciência, a verdade é que a cidade tem um encanto especial debaixo de chuva.
Como chegar How to get there
Fomos de carro até Bilbau, fica a 400 km de Madrid.
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Como se deslocar How to move around
Bilbau tem uma boa rede de metro, autocarros e elétrico, contudo, andámos a pé para todo o lado, em 20 minutos chegávamos ao centro histórico.
Onde dormir Where to sleep
Hotel Meliá Bilbao ao lado do Palácio de Euskalduna e muito perto do Museu Guggenheim, foi projetado pelo prestigioso arquiteto mexicano, Ricardo Legorreta, que, por sua vez, se inspirou na obra do escultor basco Eduardo Chillida. O pequeno-almoço era uma perdição. www.melia.com/pt/hoteis/espanha/bilbao/melia-bilbao/index.htm
Mercure Bilbao Jardines De Albia com uma excelente localização, a cinco minutos a pé da Gran Vía, encontra-se à mesma distância do Museu Guggenheim e do centro histórico. O quarto é muito cómodo e o pequeno-almoço variado. https://bit.ly/3SpQxnw
Onde comer Where to eat
La Viña del Ensanche o nosso primeiro restaurante em Bilbau recebeu-nos da melhor forma possível. De um lado, as pessoas comem pintxos ao balcão acompanhados de cañas, do outro é um simpático e acolhedor restaurante com produtos gastronómicos para venda ao público. Não deixem de provar o bolo de cenoura com gelado de queijo. lavinadelensanche.com/es/
Agavero um simpático restaurante mexicano com vista para o Guggenheim. agaverobilbao.com/
Zapirain abriram o primeiro restaurante na década de sessenta na aldeia Lekeitio, a uma hora de Bilbau. Agora, este restaurante é um elegante e acolhedor espaço na cidade. Optámos por pedir várias entradas e partilhar entre todos. De sobremesa optámos por uns canutillos crocantes recheados com idiazabal (queijo de ovelha do norte de Espanha) e brazo de gitano com caramelo. Prometemos regressar para provar o peixe fresco. www.zapirain.es/
De Santa Rosalía numa movimentada rua de bares e pequenos restaurantes, este destacou-se pela montra de pintxos e tapas. www.fincasantarosalia.com/el-restaurante/
Sugarra no centro histórico, este restaurante com carne maturada pendurada em câmaras frigoríficas irá satisfazer os desejos dos mais carnívoros. sugarra.eus/
Atseden um restaurante discreto na muito movimentada rua Ledesma. Têm a versão em pintxo dos pratos principais, então é uma excelente opção para provar um pouco de tudo. Recomendo a tortilla de bacalhau, zamburiñas, a alcachofra na brasa e o polvo. www.restauranteatseden.com
Taula ideal para um brunch completo e delicioso. As tábuas para duas pessoas são obrigatórias. Podem escolher entre tábuas doces, com waffles, croissants e iogurte, ou tábuas salgadas de queijos e húmus. taulabilbao.com/
San Telmo Pastificio um restaurante italiano acolhedor com uma carta de massas feitas à mão. Os clientes italianos sentados na mesa ao lado deram-me a garantia necessária para saber que foi uma escolha acertada. santelmopastificio.com/
O que visitar What to visit
Museu Guggenheim o ex-líbris de Bilbau, inaugurado em 1997, é composto por 3 andares de obras de referência no mundo da arte, pintura, escultura, instalação, fotografia. Uma tarde de chuva levou-nos intuitivamente para o refúgio das suas paredes. Aberto até às 19h. Preço: 13€. www.guggenheim-bilbao.eus/
Museu das Belas Artes criado em 1908, a coleção é composta por obras do século XII até à atualidade. Contém grandes nomes da pintura espanhola e flamenca, como El Greco, Zurbarán, Murillo, Goya e Van Dyck, ou vanguardistas internacionais, como Paul Gauguin e Francis Bacon, mas também alberga o maior reportório de arte basca. Aberto até às 20h. museobilbao.com/
Miradouro de Artxanda um pequeno funicular vermelho transporta-nos para o topo da montanha durante uma curta viagem de 10 minutos. No miradouro, disfrutamos de uma vista de 180º da cidade. Aberto até às 22h. Preço: 4,30€.
Igreja de San Antón é um dos edifícios mais antigos da cidade. Cumpriu funções de alcázar, um palácio fortificado de inspiração árabe. A igreja foi consagrada em 1443.
Alhóndiga é o Centro de Sociedade e Cultura Contemporânea de Bilbau. O antigo armazém de vinho e azeite é um edifício modernista do início do século XX. A reabilitação do edifício em projeto cultural foi idealizado pelo arquiteto francês Philippe Starck. Tem um cinema, salas de exposições, um restaurante, uma loja com artigos de artistas locais, um laboratório de ideias para projetos artísticos e uma piscina no último andar. Aberto até às 21h. Entrada gratuita.
Aqui está o mapa com todos os locais mencionados no post:
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